Denios Portugal
Informação profissional para a indústria alimentar portuguesa

"Setor tem um grande potencial de crescimento, desde que consiga superar os seus desafios em termos de inovação, sustentabilidade e competitividade"

Entrevista a Paulo Cadeia, diretor executivo do TECMEAT

Alexandra Costa27/11/2024

O setor produtor e transformador de carne nacional de Portugal pode ser classificado como um setor estratégico e em evolução, com características que combinam tradição, qualidade reconhecida e desafios em termos de inovação, competitividade e sustentabilidade. É desta forma que Paulo Cadeia, diretor executivo do TECMEAT, em entrevista à revista iAlimentar, caracteriza o setor, e acrescenta que Portugal é conhecido pela produção de carnes de alta qualidade, especialmente no caso da carne de porco (incluindo a icónica carne de porco preto) ou de bovino através das suas raças autóctones. A par disto, o executivo alerta para a necessidade de aumentar a formação e a qualificação contínua em novas práticas tecnológicas assim como, aumentar as atividades de inovação e de cooperação entre empresas e entidades científicas.

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O que levou à criação do TECMEAT?

A criação do Centro de Competências do Agroalimentar com foco na Indústria das Carnes (TECMEAT) deve-se essencialmente a dois pontos. O primeiro, resultante da elevada concentração de indústria do processamento de carnes que existe na região onde o TECMEAT se encontra implementado; o segundo, da visão do Município da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão em verificar que não existia a nível regional, e mesmo nacional, um centro de competências capacitado para o desenvolvimento de atividades de inovação e atividades de formação técnica e prática especificamente orientada para o setor da indústria de processamento das carnes. Nasce assim o TECMEAT, uma associação privada e sem fins lucrativos, que tem por missão potenciar o aumento da competitividade e inovação das empresas produtoras e transformadoras do setor das carnes através do seu desenvolvimento científico e tecnológico.

Em que áreas atua? Que serviços presta?

Muito embora, de forma mais alargada, o TECMEAT possa atuar em todo o setor agroalimentar, o seu foco principal é no setor das carnes e do seu processamento. Através da sua Unidade Piloto e do seu Laboratório de Microbiologia, o TECMEAT encontra-se capacitado para prestar um conjunto de serviços à indústria que passa pela formação técnica e tecnológica em ambiente piloto, pelo apoio e consultoria no desenvolvimento e caracterização de novos produtos e novas técnicas de processamento ou ainda, na disponibilização de um conjunto alargado de análises, testes e ensaios de controlo de qualidade. Para além destas componentes, o TECMEAT tem atuado também como um hub de transferência e de demonstração de conhecimento para a indústria em parceria com novos desenvolvimentos de produtos e processos obtidos com empresas de bens de equipamentos e fornecedoras de ingrediente e os mais diversos consumíveis.

Em que projetos de investigação o TECMEAT participa? Há perspetivas de novos produtos a entrar no mercado? Quando?

Atualmente, o TECMEAT participa em três projetos do PRR (Programa de Recuperação e Resiliência). Está ativamente envolvido na agenda VIIAFOOD, liderada pela Sonae, onde juntamente com outras entidades do sistema científico e uma empresa do setor cárnico temos realizado provas de conceito no desenvolvimento de produtos inovadores em três linhas diferentes. Para além deste, estamos também envolvidos em dois projetos da Bioeconomia: o projeto RN21 onde procuramos testar o comportamento de biofilmes e a aplicação de colofónia resultante das resinas da nossa indústria florestal em substituição de filmes comerciais de origem fóssil; e o Projeto BE@T no qual procuramos encontrar simbioses indústrias entre os subprodutos do setor do têxtil e vestuário e os subprodutos do setor das carnes. Em todos estes três projetos temos já protótipos de novos produtos com resultados promissores e potencialmente interessante para entrar no mercado. Para além destes projetos em execução, temos ainda algumas candidaturas em avaliação com a Associação de Criadores de Limusine e a Câmara Municipal do Fundão no sentido de virmos a prestar um conjunto de serviços ao nível de formação de rendimento de corte de carcaças de bovino.

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Como classifica o setor produtor e transformador de carne nacional?

O setor produtor e transformador de carne nacional de Portugal pode ser classificado como um setor estratégico e em evolução, com características que combinam tradição, qualidade reconhecida e desafios em termos de inovação, competitividade e sustentabilidade. Nestes curtos quatro anos de existência do TECMEAT e de contactos e parcerias já estabelecidas, verifico que tem havido um esforço de evolução ao nível da adoção de novas práticas de atividades de inovação, quer ao nível do setor produtivo como também do setor transformador. Todos sabemos que, na sua generalidade, a indústria das carnes ainda é conhecida por ser fechada e relutante em cooperar para o desenvolvimento de novos produtos e processos. Contudo, tenho assistido durante estes anos ao esforço que estas empresas começam a realizar para mudar este paradigma até porque, começam a perceber, que a sua evolução assim como a possibilidade de aumentar as suas quotas de exportação, apenas se conseguirá através da cooperação, da inovação e sobretudo da diferenciação de produtos de maior valor acrescentado. É certo que o setor é dominado por pequenas e médias empresas (PMEs), tanto na produção como na transformação, o que resulta numa fragmentação que pode dificultar a competitividade internacional, enfrentando dificuldades para competir com grandes produtores de outros países devido à falta de economia de escala e aos custos relativamente elevados de produção e mais recentemente à escassez de mão de obra classificada, mas também é verdade que o setor tem um grande potencial de crescimento, desde que consiga superar os seus desafios em termos de inovação, sustentabilidade e competitividade.

Quais considera ser os pontos fortes (e os a melhorar) do setor produtor e transformador de carne português? Em que medida a TECMEAT pode ajudar a alterar o cenário?

Sem dúvida que um dos pontos forte do setor é a qualidade da carne que produzimos. Portugal é conhecido pela produção de carnes de alta qualidade, especialmente no caso da carne de porco (incluindo a icónica carne de porco preto) ou de bovino através das suas raças autóctones tais como a Limusine, Barrosã, Arouquesa, … apenas para falar de algumas. Muitas empresas têm também investido em tecnologia moderna nos processos de abate e transformação, o que aumenta a eficiência e a rastreabilidade dos produtos. Tem havido também uma aposta crescente na automatização (e mesmo de robotização) de processos e na inovação de alguns produtos. Ao nível de pontos a melhorar, temos sem dúvida a necessidade de aumentar a formação e a qualificação contínua em novas práticas tecnológicas assim como, aumentar as atividades de inovação e de cooperação entre empresas e entidades científicas. Em todos estes pontos o TECMEAT está capacitado, quer infraestruturalmente através da sua Unidade Piloto como dos seus Laboratórios como também, para apoiar as empresas e cooperar com estas no sentido de aumentar a sua competitividade.
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O comportamento dos consumidores está a alterar-se com o crescente aparecimento de produtos plant based ou carne criada em laboratório. Como vê este fenómeno? Pode pôr em risco o setor produtor e transformador de carne nacional?

O aparecimento de produtos plant based é uma tendência que reflete necessidade de resposta ao consumo crescente e a mudanças no comportamento dos consumidores, especialmente em relação a preocupações com saúde, sustentabilidade e bem-estar animal. Contudo, considero que este fenómeno não coloca necessariamente em risco o setor produtor e transformador de carne nacional, mas sim convida-o a adaptar-se e a evoluir. O plant based será sempre uma via complementar à carne, servindo por um lado um nicho de mercado com requisitos específicos, respondendo a consumidores preocupados com a sustentabilidade e a pegada ambiental, mas pelo outro e sobretudo aquele que considero vir a ser mais promissor, uma forma complementar de resposta ao crescimento do consumo de carne. Com a humanidade continuamente a crescer assim como o consumo da carne, prevê-se que a médio prazo não haverá carne disponível para satisfazer as necessidades da população mundial e apenas aqueles com elevado poder de compra a poderão adquirir. O plant based poderá aqui, sem dúvida, dar uma reposta, mas a carne em si mesmo, continuará certamente a desempenhar um papel central na alimentação da humanidade e o setor produtor e transformador a desempenharem o seu papel.

Quais as perspetivas do setor para 2025?

As perspetivas para o setor da indústria de processamento de carnes em Portugal até 2025 refletem uma série de tendências globais que podem moldar o futuro do setor. A maior pressão ao nível da sustentabilidade e redução do impacto ambiental, com o aumento tanto da parte dos consumidores como das regulamentações europeia, será sem dúvida uma tendência crescente. A adoção de práticas de economia circular, como a utilização de subprodutos para novos fins (biocombustíveis, ração animal, fertilizantes), ou mesmo a questão das simbioses indústrias, deverá continuar a crescer. O bem-estar animal trará cada vez mais pressão pelas novas regulamentações sobre transporte, abate e transparência nas cadeias de produção. A necessidade em adotar novas tecnologias e implementação de digitalização das cadeias por forma a aumentar eficiência e reduzir desperdício será um ponto de diferenciação e por último, mas não menos importante, a mudança nos padrões de consumo através do aumento de procura por carnes mais saudáveis (menos aditivados) mais transparentes e mais éticas. Em resumo, até 2025, o setor de processamento de carnes em Portugal deverá evoluir impulsionado por inovações tecnológicas, preocupações ambientais, exigências dos consumidores por maior transparência e a expansão para mercados internacionais e as empresas que melhor se adaptarem a estas mudanças terão sem dúvida uma posição de destaque.
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A TECMEAT vai realizar a MEAT MEETINGS’ 24. Quais as perspetivas e os temas abordados?

Com a conclusão da implementação da infraestrutura do projeto TECMEAT em final de 2022, consideramos que havia condições para se realizar uma conferência a cada dois anos completamente direcionada para o setor das carnes, na qual fosse possível divulgar produtos e tecnologias inovadoras. Realizada com sucesso a 1ª edição em setembro de 2022, com mais de 150 participantes, estamos em 2024 a organizar a 2ª conferência com dois painéis: Sustentabilidade e Digitalização. Estes dois temas são de fato as preocupações globais em qualquer indústria a nível internacional e consideramos que os oradores que conseguimos reunir vão aportar á audiência diverso conhecimento assim como desenvolvimentos e soluções obtidas, com o objetivo de gerarmos novas potencialidade de cooperação. As nossas perspetivas são de facto bastante otimistas e temos razões para estarmos, até porque o número de inscritos tem vindo a crescer de semana para semana, uma parte considerável dos quais pertencentes a empresas da indústria do processamento das carnes.

Que resultados espera que saiam do evento?

O principal resultado que esperamos é de facto haver networking com resultados, resultados ao nível do incremento de cooperação entre empresas e instituições como o TECMEAT, resultados ao nível de catalisar atividades de inovação, mas sobretudo, e acaba por ser o mais importante, satisfação da audiência. Ficando a audiência satisfeita e sobretudo a indústria do processamento das carnes, é sinal de estamos a cumprir a nossa missão e desejo para que comecemos a delinear o MEAT MEETINGS’ 26.

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