ENTREVISTA 32 GEOPOLÍTICA E CADEIAS DE ABASTECIMENTO Que impactos tem sentido o setor com a instabilidade geopolítica? Os conflitos e a instabilidade geopolítica têm tido um impacto significativo no setor agroalimentar. Os custos logísticos aumentaram, o acesso a certos mercados tornou-se mais difícil e o planeamento tornou-se mais complexo e exigente. Apesar disso, o setor tem demonstrado grande resiliência. Os riscos são reais e persistentes e a diversificação de mercados é algo a ter em conta para garantir a competitividade e a estabilidade das exportações. No caso concreto dos EUA, trata-se de um mercado que valoriza bastante os produtos e não é fácil encontrar alternativas sem perda de valor. Para as exportações de frutas e legumes portugueses não é um mercado direto relevante, no entanto, indiretamente, o impacto das tarifas é muito preocupante. Produtos de outras geografias que normalmente exportavam para os Estados Unidos poderão ver na União Europeia um mercado alternativo afetando, assim, a valorização dos nossos produtos. Como aumentar a resiliência? É possível diversificar de forma estruturada? Existem sempre alternativas, mas a valorização pode ser afetada. A contínua procura de abertura de mercados e alternativas é fundamental. Portugal tem de apostar numa estratégia nacional para a exportação e internacionalização do setor agroalimentar, focada na diversificação geográfica e na construção de relações comerciais mais estáveis. A ação tem de ser articulada entre setor e Governo. O que falta para as empresas aproveitarem melhor os acordos comerciais da UE? A União Europeia é líder mundial nas exportações do agroalimentar. E todos os acordos comerciais têm sido amplamente favoráveis ao setor. Esperamos com grande expectativa a concretização do acordo com o Mercosul, em que a UE teve muito cuidado com as áreas mais sensíveis. Será uma oportunidade de aposta, forte, naquele bloco geográfico, com a grande vantagem da língua e da proximidade cultural. As empresas portuguesas do setor terão uma excelente oportunidade para reforçar as suas exportações para fora da UE. Este é um acordo que deve ser altamente aproveitado e a Portugal Fresh já está a reforçar a presença em feiras e a planear a organização de ações de prospeção e missões empresariais naquela geografia, com o objetivo de maximizar esta oportunidade. Qual a prioridade estratégica para a fileira agroalimentar até 2030? A prioridade é clara: garantir água para produzir. Sem uma estratégia robusta de gestão e armazenamento hídrico, não será possível garantir segurança alimentar, estabilidade produtiva e competitividade externa. É preciso mais ambição! Água é soberania. Que mensagem deixaria aos líderes empresariais do setor? O setor agroalimentar é, indiscutivelmente, estratégico para Portugal. Não apenas pela sua relevância económica, mas também pelo impacto social e ambiental que representa. Para além de ser um motor de criação de valor e de emprego, a agricultura desempenha um papel essencial na coesão territorial, ajudando a manter vivas as regiões do interior e a travar o avanço da desertificação. É um setor que sustenta comunidades, preserva paisagens e garante o equilíbrio do território. Às empresas, apelo a que continuem a apostar na qualidade, na inovação, na ambição e na promoção internacional. O setor agrícola já provou que sabe crescer com consistência. Agora, é hora de reclamar mais visão estratégica para o país. Portugal pode e deve ser uma potência agroalimentar na Europa. n GONÇALO SANTOS ANDRADE Gonçalo Santos Andrade é presidente da Portugal Fresh, Associação para a Promoção das Frutas, Legumes e Flores de Portugal, tendo acompanhado o crescimento das exportações do setor, que duplicaram na última década. Engenheiro agrícola formado pela Escola Superior Agrária de Castelo Branco, completou o Programa de Direção de Empresas e o Programa GAIN, Direção de Empresas Agrícolas e Agroindustriais na AESE Business School, do qual é o atual diretor. É também diplomado em Market Driving Strategies pela London Business School. Desde 2004 que participa, anualmente, nos principais eventos de mercados internacionais do setor das frutas e legumes, e organizou e participou em missões empresariais, ações de prospeção de mercado e feiras internacionais em mais de 17 países e quatro continentes. Com uma vasta experiência na gestão de empresas hortofrutícolas, é ainda Vice-Presidente da direção executiva da CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal), Chairman do ICOP (International Conference of Producers Organization), sócio da Casa Prudêncio, Sociedade Agropecuária, Lda., e Administrador Executivo da Lusomorango, a maior organização de produtores de frutas e legumes em Portugal em volume de negócios.
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